Mazdutide: conheça o novo medicamento para tratamento da obesidade

Obesidade é um dos principais problemas de saúde contemporâneos. Estima-se que no mundo estejamos nos aproximando de 1 bilhão de pessoas nesta situação; no Brasil a estimativa chega a 20% da população, considerando dados de 2019 da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica. Em função desta elevada prevalência, bem como os conhecidos riscos para a saúde,
existe alto interesse em tratamentos para esta condição.
A base do tratamento são medidas de estilo de vida, especialmente ajustes na alimentação e realização de atividades físicas, uma vez que essas são medidas que tem benefícios que vão além do controle do peso. Por muito tempo, entretanto, as opções farmacológicas eram escassas. Anfetaminas tinham efeitos adversos graves e foram retiradas do mercado brasileiro, medicamentos psiquiátricos e anticonvulsivantes desenvolvidos com outros objetivos tinham eficácia reduzida. Essa limitação restringia as possibilidades clínicas, restando a cirurgia como principal alternativa para graus mais elevados de obesidade (IMC acima de 40 kg/m2) ou esta está acompanhada de complicações.
Felizmente, há aproximadamente uma década, começaram a ser lançados medicamentos análogos a um hormônio peptídico intestinal (o
glucagon-like peptide-1
[GLP-1]) que possuiam maiores efeitos no peso. Inicialmente desenvolvidos para o tratamento do diabetes
mellitus
(DM) tipo 2, além de controlar a hiperglicemia, os estudos começaram a mostrar marcada redução de peso. Esses resultados benéficos e mais animadores se iniciaram com a liraglutida atingindo perda de quase 10 kg em pacientes com obesidade. Hoje já há medicamentos que atingem perdas de peso média de mais de 20 kg. Os primeiros fármacos eram exclusivamente análogos do GLP-1, mas mais recentemente a indústria passou a criar medicamentos com efeitos combinados de múltiplos peptídeos intestinais; a tirzepatida e a
CagriSema
são dois exemplos deste último grupo que já estão disponíveis para uso clínico.
Em resumo, considerando a importância da obesidade e o cenário de rápidas mudanças no tratamento farmacológico, existe elevado interesse em novos lançamentos de medicamentos incretínicos. Neste sentido, a mazdutida é uma opção nova que estudos clínicos começam a ser publicados.
O básico: como a mazdutida funciona?
A molécula deste medicamento é baseada em um dos diversos peptídeos liberados no intestino após a alimentação: a oximodulina. Para além da sua porção semelhante à oximodulina, há uma cadeia lipídica (um ácido graxo), que busca modular sua absorção. O medicamento foi desenvolvido pela empresa chinesa Innovent Biologics em parceria com a Eli Lilly (produtora da tirzepatida).
A mazdutida é um medicamento com efeito análogo ao GLP-1, assim como a liraglutida (Victoza®, Saxenda®) e a semaglutida (Ozempic®, Wegowy®). Este efeito gera aumento da saciedade, redução do esvaziamento gástrico e perda ponderal. Entretanto, trata-se de uma molécula com efeito duplo, acionando também o receptor de glucagon. A ação semelhante ao glucagon estimula a produção hepática de glicose, além de promover lipólise e oxidação de ácidos graxos. Quando combinada a agonistas de GLP-1, essa ativação pode levar à perda de peso e melhora do perfil metabólico, desde que o efeito hiperglicemiante seja controlado (ação do GLP-1). Em suma, com esta ação dupla espera-se que se aumente a potência em termos de redução de peso e controle glicêmico sem aumentar os eventos adversos.
Na prática: o que os estudos clínicos mostram?
Aqui vale destacar que este é um medicamento cujos resultados ainda são pouco conhecidos. Para se compreender, havia apenas 17 entradas para mazdutida (e seus nomes moleculares: IBI362 or LY3305677) no Pubmed até agosto de 2025, sendo 6 estudos com pacientes. Como vimos no processo de seu desenvolvimento, trata-se de um medicamento que terá o enfoque do mercado chinês. Isso pode ser notado nos estudos clínicos publicados: quase todos foram realizados na China. Ainda não está claro se ele será testado e comercializado em outros países.
A maioria dos estudos clínicos realizados foram de fase 1 e 2, sendo apenas um deles de fase 3. Isto significa que são estudos pequenos, buscando identificar a dose ideal do medicamento e mapear o perfil de segurança; apenas um estudo envolveu um número maior de pacientes. O medicamento foi testado em pacientes com obesidade e DM tipo 2. Em termos de eficácia para perda de peso, dados de metanálise indicam perda média de 6% do peso corporal, com doses de 6 mg atingindo perdas maiores a 10%; maior tempo de uso foi associado com maior perda de peso. Quanto a controle glicêmico existem menos dados. O medicamento parece leva a redução de 1,5% de HbA1c ao longo de 20 semanas de tratamento, resultado semelhante à dulaglutida que foi usada como comparador ativo no estudo que avaliou esse desfecho.
Quanto aos efeitos adversos, o perfil parece semelhante aos demais medicamentos da classe. Náuseas, vômitos, redução de apetite, diarreia e estufamento são todos relativamente comuns. Chama a atenção taxa de hipoglicemia perto de 3%, bem como até 10% dos pacientes com reações no local da aplicação.
Por fim, deve-se destacar que não existem ainda estudos comparando este medicamento com os seus principais concorrentes, como semaglutida e tirzepatida. A perda de peso com ele é numericamente menor, mas ele foi testado em uma população que tende a ter peso menor no basal (asiáticos); tanto que os limiares de sobrepeso e obesidade são diferentes dos usuais nestas populações. Em suma, como a mazdutida se comporta em relação aos outros fármacos disponíveis ainda não é sabido.
Conclusão
A mazdutida é um novo medicamento da família das incretinas, inovando por combinar efeitos do GLP-1 e do glucagon. Seu uso gera efeitos positivos para obesidade e DM tipo 2. Ela foi testada e desenvolvida com enfoque na população da China e não se sabe se e quando estará disponível no Brasil. Independente disso, a mazdutida também demonstra que há pesquisas intensas neste assunto e que muitas novidades são esperadas no campo dos fármacos com efeito incretínico.