O MAIOR ECOSSISTEMA DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE DO BRASIL

Artmed

O MAIOR ECOSSISTEMA DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE DO BRASIL

Artmed
  • Home
  • Conteúdos
  • Terapia Baseada em Processos (PBT): a quebra de paradigmas na Terapia Cognitivo-Comportamental

Terapia Baseada em Processos (PBT): a quebra de paradigmas na Terapia Cognitivo-Comportamental

A Terapia Baseada em Processos (PBT, do inglês
Process-Based Therapy
) representa uma mudança significativa no paradigma da psicoterapia, especialmente dentro do campo da abordagem cognitivo-comportamental. Ao invés de se ancorar em protocolos rígidos centrados em diagnósticos, a PBT foca nos processos psicológicos fundamentais que sustentam o sofrimento humano e o bem-estar, buscando intervenções mais individualizadas e flexíveis (Hofmann et al., 2023). 

O que é a Terapia Baseada em Processos?
 

É cada vez mais comum a chegada de pacientes sem um diagnóstico específico ou com múltiplas demandas para o atendimento terapêutico. Sendo assim, caso o terapeuta foque apenas em um sintoma, funcionamento ou demanda específicos, o tratamento ficará defasado. Por exemplo, pode-se receber um paciente com sintomas de ansiedade social e, ao mesmo tempo, dificuldade em se posicionar de forma assertiva para os familiares. Caso o terapeuta foque apenas no tratamento do transtorno, isso não suprirá a demanda do paciente, que sairá da terapia com dificuldades importantes (Hofmann & Heyes, 2019). 

Pensando nisso, A PBT foi contextualizada por Hofmann, Hayes & Lorscheid e tem crescido no contexto do consultório. É uma abordagem transdiagnóstica e integrativa que visa promover mudanças em processos psicológicos empiricamente identificáveis e clinicamente relevantes, caminhando em direção a um modelo mais funcional e contextual (Hofmann et al., 2023).  

O termo "processo" diz respeito a mecanismos dinâmicos e interativos — cognitivos, emocionais, comportamentais e fisiológicos — que influenciam como as pessoas se adaptam ou não a suas circunstâncias. Exemplos incluem processos como evitação experiencial, fusão cognitiva, regulação emocional, consequências a um comportamento específico, autoconhecimento e automonitoramento (Hofmann & Heyes, 2019; Hofmann et al., 2023). 

Diferenças entre PBT e Terapias Cognitivo-Comportamentais “Tradicionais”
 

Enquanto a TCC de Beck (2013) procura aplicar protocolos específicos para transtornos (como depressão, diferentes diagnósticos de ansiedade etc.), a PBT busca compreender quais processos estão ativos no sofrimento de
cada indivíduo
, independentemente de diagnósticos. Na prática, isso significa que dois pacientes com o mesmo diagnóstico (por exemplo, transtorno de ansiedade generalizada) podem receber intervenções diferentes, com base nos processos específicos que mantêm suas dificuldades e queixas. Por outro lado, duas pessoas com diagnósticos diferentes podem se beneficiar da mesma intervenção, se apresentarem o mesmo processo desadaptativo predominante. Sabe-se que, no exemplo da TAG, existem mecanismos similares de funcionamento, como o padrão excessivo de preocupações; isso não significa que dois indivíduos com TAG apresentarão esse padrão da mesma forma, com os mesmos gatilhos. Logo, faz muito sentido um olhar mais individualizado.  

Benefícios da Terapia Baseada em Processos
 

Para os psicólogos, são muitos os benefícios da utilização da PBT nos atendimentos. A começar pela individualização do tratamento, uma vez que a PBT permite uma adaptação precisa das intervenções às demandas de cada paciente, levando em conta sua história, contexto e funcionamento psicológico único. Por conta disso, outro benefício é o fato de as intervenções serem transdiagnósticas, reduzindo a necessidade de aplicar múltiplos protocolos em pacientes com comorbidades, focando nos processos centrais que atravessam diferentes transtornos.  

Uma vez que as intervenções são transdiagnósticas e individualizadas, é possível lançar mão de estratégias mais criativas com técnicas de diferentes abordagens dentro das TCCs, como conceitos da Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), da Dialética Comportamental (DBT), Terapia Focada na Compaixão (TFC) e, obviamente, da própria TCC tradicional de Beck. Outro benefício é que a PBT encoraja o uso de ferramentas de avaliação contínua de progresso, o que aumenta a precisão e a responsividade do terapeuta ao longo do tratamento, viabilizando um monitoramento contínuo do processo terapêutico. Por fim, outra grande vantagem do uso da PBT é que esta é uma abordagem com base científica robusta, já que utiliza descobertas das neurociências, análise das cognições e do comportamento e teoria da evolução para fundamentar a escolha das intervenções (Hayes & Hofmann, 2020; Hofmann et al., 2023). 

Imagine uma paciente com histórico de traumas e diagnóstico de transtorno de personalidade borderline. Ao invés de aplicar exclusivamente o protocolo da DBT, o terapeuta baseado em processos identifica que os principais mecanismos podem ser: desregulação emocional, fusão com autocríticas e comportamento impulsivo. Pensando nisso, o plano terapêutico pode incluir, além da DBT, técnicas de autocompaixão para a autocrítica desfusão cognitiva e alinhamento com os valores da paciente (ACT). 

Como aplicar a PBT na prática clínica
 

A implementação da Terapia Baseada em Processos envolve várias etapas-chave, que vão desde a avaliação funcional até a formulação dinâmica de casos e o uso intencional de técnicas baseadas em evidência. A primeira tarefa é mapear os processos psicológicos centrais envolvidos no sofrimento do paciente. Isso vai além da coleta de sintomas: o foco está em entender
como
e
por que
certos padrões cognitivos, emocionais e comportamentais estão sendo mantidos. Ferramentas como entrevistas clínicas, questionários transdiagnósticos, além da observação e análise funcional do comportamento, são úteis para esse mapeamento. Isso facilita o desenho dos processos, que permite ao terapeuta compreender e avaliar as relações entre diferentes constructos na vida do paciente (Hofmann et al., 2021; Hofmann et al., 2023). 

Após a avaliação, o terapeuta elabora um modelo que explique a manutenção do sofrimento do paciente em termos de processos psicológicos, não apenas de sintomas. Para exemplificar, imagine uma paciente com sintomas de depressão que apresente rigidez comportamental, evitação experiencial e ruminação como processos centrais. Como são sintomas “típicos” do funcionamento depressivo, o terapeuta pode não se atentar aos fatores de manutenção e ir direto para um tratamento mais protocolar para tais queixas. Uma investigação baseada em PBT, por outro lado, permitiria aprofundar as circunstâncias que mantém essas dificuldades, como problemas familiares, por exemplo. Já outro paciente com os mesmos sintomas de depressão pode apresentar autocrítica punitiva, isolamento social e crenças de desvalor, mantidos por problemas de autoestima e sobrecarga no trabalho. Cada um receberá intervenções diferentes, mesmo com sintomas semelhantes (Hofmann et al., 2021). 

Ao identificar os processos principais, o terapeuta seleciona técnicas da abordagem compatível com a modificação desses processos. Isso pode incluir técnicas de ativação comportamental, exposição com prevenção de resposta, desfusão cognitiva (ACT), questionamento socrático, autoinstrução (DBT) e/ou mindfulness. É válido salientar que todas as técnicas são estruturadas de acordo com as demandas do paciente e com as evidências disponíveis de sua aplicação, uma vez que todas elas estão dentro da abordagem cognitivo-comportamental (Hofmann & Hayes, 2019; Hofmann et al., 2021). 

Um dos objetivos centrais da PBT é capacitar o paciente a se tornar um observador e agente mais consciente de seus próprios processos, desenvolvendo autonomia para lidar com o sofrimento a partir de repertórios mais flexíveis e adaptativos. Além disso, permite que o paciente desenvolva habilidades específicas para lidar com suas dificuldades e com os fatores que as mantêm (Hofmann et al., 2023). 

Conclusão
 

A Terapia Baseada em Processos representa um avanço significativo na psicoterapia contemporânea. Ao priorizar a compreensão dos mecanismos centrais do sofrimento humano — e não apenas seus sintomas — ela permite uma atuação mais precisa, individualizada e eficaz. Com raízes firmes na tradição cognitivo-comportamental, mas abrindo espaço para integração teórica e metodológica, a PBT convida o terapeuta a um papel mais científico, criativo e sensível ao contexto. Sendo assim, a PBT resgata a ideia de que cada ser humano é único — e que sua jornada terapêutica também deve ser. 

Rebessi, I. P., Lobo, B. O. M., & Neufeld, C. B. (Abr., 2025). Terapia Baseada em Processos (PBT): a quebra de paradigmas na Terapia Cognitivo-Comportamental. Blog da Artmed.

Autoras

  • Isabela Pizarro Rebessi 
     

Psicóloga e Mestre em Psicologia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo (USP). Doutoranda em Psicologia em Saúde e Desenvolvimento pela FFCLRP-USP. Especialista em Terapia Cognitivo Comportamental pelo CETCC. Terapeuta Certificada pela Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). Supervisora clínica em Terapia Cognitivo Comportamental e Terapia do Esquema. Professora em cursos de Pós Graduação em Terapia Cognitivo Comportamental e Terapia do Esquema. Pesquisadora e Supervisora do Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo Comportamental (LaPICC-USP).  

  • Beatriz de Oliveira Meneguelo Lobo
     

Psicóloga e Mestra em Psicologia (área de concentração Cognição Humana) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Doutoranda em Psicologia em Saúde e Desenvolvimento pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo (USP), com bolsa pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Especialista em Terapias Cognitivo-Comportamentais e com Formação em Terapia do Esquema. Pesquisadora e Supervisora no Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental (LaPICC) da Universidade de São Paulo (USP). Membro associada à Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). 

  •  
    Editora-chefe:
     Carmem Beatriz Neufeld. 

Psicóloga. Livre docente em TCC pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - USP. Pós-Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutora e Mestra em Psicologia pela PUCRS. Fundadora e Coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental – LaPICC-USP. Professora Associada do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP. Presidente da Federação Latino Americana de Psicoterapias Cognitivas e Comportamentais - ALAPCCO (2019-2022). Presidente-fundadora da Associação de Ensino e Supervisão Baseados em Evidências - AESBE (2020-2023). Bolsista Produtividade do CNPq.