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Funções executivas no autismo: o que são e como estimulá-las?

As funções executivas são funções mediadas pelo córtex pré-frontal e que possuem algumas definições que tendem a se complementar (FRIEDMAN; ROBINS, 2021). Um dos modelos mais discutidos atualmente é o modelo de Diamond (2013), em que ela propõe que haveriam três funções de base, sendo elas o controle inibitório, a memória de trabalho (ou operacional) e a flexibilidade mental que seriam necessárias para funções consideradas superiores, sendo elas a resolução de problemas, o raciocínio e o planejamento. 

O controle inibitório relaciona-se à capacidade de inibir comportamentos automáticos para apresentar comportamentos mais adequados ao contexto, enquanto a memória de trabalho envolve a capacidade de manipulação mental de informações e a flexibilidade mental é a habilidade de ser capaz de, através da observação, ser capaz de mudar as estratégias frente à algum problema (DIAMOND, 2013). 

As funções seguintes são definidas da seguinte maneira: a resolução de problemas, como o próprio nome já diz, envolve a capacidade de lidar e buscar soluções para problemas complexos. O raciocínio diz respeito à capacidade lógica, enquanto o planejamento relaciona-se à capacidade de organização do indivíduo, sendo que os dois primeiros se relacionam diretamente à inteligência fluída (DIAMOND, 2013). 

As funções executivas, por serem mediadas pelo córtex pré-frontal, são as últimas funções cognitivas a amadurecerem. O desenvolvimento ocorre durante o ciclo vital, chegando à maturidade no final da adolescência e início da vida adulta (LERNER, 2015). Assim, é através delas que a criança vai conseguir se organizar para agir nas atividades e em seu dia a dia.  

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é considerado um transtorno do neurodesenvolvimento, ou seja, é algo que ocorre durante o desenvolvimento da criança e a acompanha por toda a vida. Ele envolve prejuízos na interação social, incluindo dificuldades de compreender piadas ou ironias, compreender os próprios sentimentos e o de outras pessoas, assim como dificuldades na leitura de ambientes e situações. Um segundo ponto de prejuízo significativo relaciona-se com o perfil de funcionamento mais rígido e inflexível, com uma visão mais concreta e objetiva e falhas em como alternar estratégias (APA, 2023). 

Funções executivas no autismo
 

Prejuízos cognitivos relacionados ao TEA envolvem as funções executivas diretamente (DEMETRIOU, 2018;2019) e sua estimulação pode contribuir para melhor prognóstico para o desenvolvimento da Teoria da Mente, adaptação e socialização (SEABRA, BOSA & DIAS, 2017). Os achados mostram-se heterogêneos acerca dos prejuízos, indicando que há um prejuízo geral, seja através da mensuração, seja através da ótica dos pais (ROSENTHAL et al, 2013). 

O prejuízo no controle inibitório envolve a dificuldade da criança em inibir um comportamento inadequado, bem como lidar com interferências e controlar pensamentos. Isso pode envolver não conseguir interromper alguns comportamentos estereotipados ou mesmo respostas automáticas às situações comuns em sala de aula, como por exemplo, manter-se em silêncio durante a explicação da professora. 

Na
memória operacional
, os danos se relacionam à capacidade de gerir e interagir com as informações do ambiente de maneira a conseguir responder a elas adequadamente, podendo ser traduzidas na inabilidade em receber as instruções de seu interlocutor e agir de acordo com o proposto. 

Acerca da
flexibilidade mental
, os comportamentos rígidos são traduzidos em dificuldades cotidianas, como por exemplo, querer escolher sempre o mesmo local na sala de aula, usar os mesmos objetos, bem como seguir a mesma rotina. 

 Ao se falar em
resolução de problemas e raciocínio
, prejuízos relacionados à dificuldade em buscar novas soluções para problemas cotidianos ou na execução de atividades comuns à rotina escolar.  

Por último, prejuízos no
planejamento
envolvem a dificuldade da criança em se organizar com seus materiais, por exemplo, ou em conseguir executar tarefas em uma determinada ordem a ser planejada por ela, para melhor execução do que precisa.  

Estratégias para estimular as funções executivas
 

Algumas atividades que podem ser realizadas com as crianças envolvem desde jogos já estruturados como atividades que podem ser criadas de acordo com as demandas que elas apresentem. A criatividade de quem irá elaborá-las será sempre uma peça chave que irá contribuir de maneira positiva para tal construção. 

Um recurso a ser utilizado de maneira a personalizar e fazer o interesse da criança ou adolescente ser maior é buscar assuntos de seu interesse na elaboração da atividade. Por exemplo, se uma criança é fã de Pokémon, criar uma atividade de flexibilidade na qual ela precise alcançar um objetivo e, até chegar a ele vai perdendo alguns pokémons, sendo necessário escolher outros, é uma maneira de estimular sua flexibilidade, fazendo com que a criança explore outras possibilidades de companheiros que não o que ele está acostumado a lidar.  

A mesma estratégia de um assunto de interesse pode ser utilizada para as outras funções cognitivas, como o treino de planejamento, quando a criança necessita estabelecer uma meta a ser alcançada e, assim, através do objetivo final de ter de lutar com determinados pokémons, fazendo escolhas entre os mais fortes e fracos, ela possa elaborar sua estratégia de luta para vencer seus inimigos.   

Exemplos práticos e dicas
 

As estratégias aqui apresentadas são sugestões e devem ser consideradas de acordo com o perfil cognitivo e de tolerância à frustração de cada criança ou adolescente, sendo necessário o estabelecimento, por parte de quem estimula, das metas para se alcançar o resultado pretendido com quem será estimulado, dividindo-se as atividades de acordo com o seu nível de dificuldade, a fim de se seguir a proposta da aprendizagem sem erros, compreendida como a possibilidade de se realizar intervenções antes que o indivíduo cometa erros, a fim de aumentar sua confiança durante o processo (MIDDLETON; SCHWARTZ, 2012)  

O uso de atividades prontas, como o jogo UNO, por exemplo, pode ser uma maneira de se trabalhar com a inibição, flexibilidade e também com o planejamento, pois é necessário se organizar para a escolha das cartas a serem utilizadas a fim de se diminui-las até ficar sem nenhuma, mas também envolve a inibição de um pré-planejamento que pode ser alterado pelo jogador anterior e flexibilidade cognitiva, exigindo agilidade na alteração de tal estratégia.  

Jogos comumente encontrado para se trabalhar o planejamento envolvem situações em que há diferentes carros presos em um estacionamento e é necessário se movimentar um carro por vez até que todos possam ser liberados. Jogos como senha, para estimulação do raciocínio também podem ser utilizados, assim como jogos de adivinhação e conteúdos que envolvam a entrega de pistas para que as crianças possam adivinhar a informação final.   

Conclusão

As funções executivas se desenvolvem ao longo de toda a infância e adolescência e tendem a apresentar maiores prejuízos, de maneira geral, em indivíduos dentro do espectro. Com isso, seja em terapias, em casa e na escola, sua estimulação mostra-se necessária para melhor desenvolvimento delas.  

Tornar lúdica tal estimulação contribui para melhor aderência e o uso do interesse específico também facilita isso. O uso de instrumentos e atividades elaboradas ou prontas são ferramentas utilizadas nesse processo e tendem a obter uma boa resposta das crianças. Por fim, salienta-se que quanto mais personalizada for a escolha das atividades, pode contribuir para tal adesão, assim como evolução da criança, respeitando seus limites.  

Como citar este artigo: Oliveira, C. M., Lobo, B. O. M., & Neufeld, C. B. (Abr., 2025).
Funções executivas no autismo: o que são e como estimulá-las?.
Blog da Artmed. 

Autoras
 

  •  
    Camilla Monti Oliveira
     

Possui graduação em Psicologia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - USP (2009) e aprimoramento e especialização em Neuropsicologia no Contexto Hospitalar pelo Instituto de Psiquiatria (IPq - HCFMUSP). Mestranda do Programa de Psicobiologia da FFCLRP - USP. Concursada do Hospital das Clínicas da USP - RP. por 5 anos. Atualmente atua com avaliação neuropsicológica e psicológica no âmbito particular, além de ser professora de diversas pós graduações no estado de São Paulo. 

  •  
    Beatriz de Oliveira Meneguelo Lobo
     

Psicóloga e Mestra em Psicologia (área de concentração Cognição Humana) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Doutoranda em Psicologia em Saúde e Desenvolvimento pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da Universidade de São Paulo (USP), com bolsa pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Especialista em Terapias Cognitivo-Comportamentais e com Formação em Terapia do Esquema. Pesquisadora e Supervisora no Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental (LaPICC) da Universidade de São Paulo (USP). Membro associada à Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC). 

  •  
    Editora-chefe:
     Carmem Beatriz Neufeld. 

Psicóloga. Livre docente em TCC pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - USP. Pós-Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutora e Mestra em Psicologia pela PUCRS. Fundadora e Coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental – LaPICC-USP. Professora Associada do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP. Presidente da Federação Latino Americana de Psicoterapias Cognitivas e Comportamentais - ALAPCCO (2019-2022). Presidente-fundadora da Associação de Ensino e Supervisão Baseados em Evidências - AESBE (2020-2023). Bolsista Produtividade do CNPq.