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Erro de medicação: como prevenir e manejar

Erros de medicação são eventos adversos frequentemente preveníveis que ocorrem ao longo do processo de prescrição, dispensação, preparo ou administração de medicamentos. Em um cenário global de crescente complexidade nos sistemas de saúde, especialmente diante de envelhecimento populacional e poli farmácia, revisões científicas recentes ressaltam a urgência de estratégias integradas de prevenção e manejo desses erros. 

Os erros de medicação são evitáveis e considerados uma das importantes causas de agravos à saúde em todo mundo, por resultarem em elevadas taxas de mortalidade, prolongarem o período de hospitalização, afetarem o tratamento, além de aumentarem as despesas da assistência em saúde. Segundo análise da Organização Mundial da Saúde (OMS), divulgada em 2017, os custos mundiais associados a erros de medicação são de aproximadamente US$ 42 bilhões por ano. 

Esses dados sobre os custos dos erros de medicação geraram iniciativas globais para uma meta de redução de 50% dos danos graves e evitáveis relacionados à medicação, de modo que o 
Global Patient Safety Challenge
, da OMS, elegeu a “Medicação Sem Danos” como seu terceiro Desafio Global, visando expor e discutir as fragilidades nos sistemas de saúde e estabelecer estratégias de prevenção de tais ocorrências. Os fatores desencadeantes dos erros de medicação são múltiplos e parte deles é originada por falhas de comunicação entre os profissionais de saúde e problemas relacionados à gestão e organização. No entanto, os fatores psicossociais desempenham um papel crucial no surgimento desses erros. 

Definição e impacto dos erros de medicação
 

Erros de medicação são definidos como falhas em qualquer etapa do processo medicamentoso que possam resultar no uso inadequado de medicamentos e causar dano ao paciente. Um estudo de abrangência global estimou que cerca de 3% dos pacientes experimentavam danos evitáveis relacionados a medicamentos, sendo que pelo menos um quarto desses eram graves ou potencialmente letais. Estudos em contextos específicos—como unidades de terapia intensiva, internações hospitalares e emergência—reportam prevalências de erros que variam entre 16% e 44% entre profissionais, e taxas de administração que chegam a quase 28%. 

Esses dados evidenciam o impacto significativo na segurança do paciente, na carga financeira para os sistemas de saúde e no desgaste emocional dos profissionais envolvidos. 

Importância da segurança do paciente
 

A segurança dos pacientes envolve a preocupação de como os medicamentos são prescritos, dispensados, administrados e monitorados nos estabelecimentos de saúde, sendo a possibilidade da prevenção uma das diferenças marcantes entre as reações adversas e os erros de medicação, pois os erros de medicação são por definição preveníveis. Assim, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) recomenda que os serviços de saúde possuam sistemas ou programas de avaliação e prevenção de erros de medicação. 

A segurança do paciente é pilar essencial da qualidade assistencial. Normativas como os “National Patient Safety Goals” reforçam o uso seguro de medicamentos como prioridade institucional em múltiplas regiões do mundo. Adotar cultura de segurança significa promover ambientes onde incidentes possam ser notificados sem punição, com foco no aprendizado contínuo e na melhoria dos processos. 

Causas comuns dos erros de medicação
 

  • Falhas na comunicação:
    comunicação ineficaz, abreviações ambíguas ou inelegíveis, checagem incorreta ou não checagem e passagens de plantão deficientes são causas frequentes. 
  • Rotulagem e embalagens semelhantes:
    medicamentos com embalagens parecidas ou rótulos confusos aumentam o risco de administração incorreta, especialmente em situações de alta demanda. 
  • Dosagem e cálculo inadequados:
    a falha nos cálculos de dosagem é amplamente reportada. Um estudo de 2025 indicou que erros de cálculo continuam frequentes, especialmente em ambientes de enfermagem com alta rotatividade e uso limitado de tecnologia. 
  • Administração incorreta:
    troca de via, horário errado ou omissão também são situações comuns. A sequência dos "nove certos" (paciente certo, medicamento certo, via certa, hora certa, dose certa, registro certo, ação certa, forma certa e resposta certa) é fundamental, mas sua aplicação nem sempre é rigorosa na prática diária. 
  • Carga de trabalho elevada dos profissionais:
    a redução da carga de trabalho e a constituição suficiente da equipe de enfermagem foram relatadas como estratégias na redução de erros de medicação. Em um estudo realizado em unidade de terapia intensiva, foi identificado que a carga de trabalho pesada devido ao grande número de pacientes, somada à fadiga, sono e estresse, agravaram a ocorrência de diferentes erros no processo de administração de medicamentos. 

Estratégias de prevenção
 

Protocolos, checklists e dupla checagem 

Implementação de protocolos padronizados reduz variação e erros. A revisão integrativa em unidades de emergência destacou a eficácia de checklists, comissões multidisciplinares e alimentação de dados sistemáticos para reduzir eventos adversos. Simulações de dupla checagem em unidades pediátricas resultaram em queda significativa de erros e até ausência de incidentes por período. 

Integração do farmacêutico clínico com a equipe

Revisões recentes demonstram que a atuação ativa do farmacêutico clínico, em colaboração com médicos e enfermeiros, contribui significativamente para redução de eventos adversos. Educação liderada por farmacêuticos reduz erros relacionados a abreviações de alto risco e melhora tomada de decisão de prescrição. 

Treinamento e educação continuada

Formação contínua com foco em farmacologia segura, uso de rotinas padronizadas e simulações de cenários podem fortalecer a competência da equipe. A educação baseada em simulações e jogos, aliada a workshops inter profissionais, mostrou eficácia no desenvolvimento de habilidades para evitar erros. Além disso, os conceitos como os seis certos, medicamentos de alto risco e medicamentos com nomes semelhantes/som iguais são fundamentais para a prática segura. 

Manejo do erro quando ocorre
 

Notificação, avaliação e comunicação com a equipe

Quando ocorre erro, a notificação imediata em sistemas internos não punitivos é prioridade. A avaliação do impacto clínico deve ser conduzida rapidamente, incluindo monitoramento do paciente e envolvimento da equipe multiprofissional para definir ações corretivas e preventivas. 

Medidas para minimizar danos ao paciente

Intervenções rápidas podem incluir administração de antídotos, ajuste de esquema terapêutico, monitoramento intensivo de sinais vitais e exames laboratoriais, além de suporte psicológico se necessário. 

Cultura de segurança e melhoria contínua
 

A criação de comitês institucionalizados de segurança e administração da medicação promove supervisão contínua e revisão das práticas. Além disso, tecnologias emergentes, como sistemas de inteligência artificial e modelos de linguagem natural para suporte à decisão clínica, têm demonstrado promissora eficácia na identificação de problemas de prescrição, especialmente em modo cooperativo com farmacêuticos. 

Um estudo de enfermagem de 2025 recomenda fortemente a integração de inteligência artificial generativa em algoritmos que auxiliem na redução de erros de cálculo e na adesão a protocolos de dupla checagem. 

Conclusão
 

O papel da enfermagem é central na prevenção e no manejo de erros de medicação. Como principal elo na administração dos medicamentos, a equipe de enfermagem deve dominar os princípios dos “nove certos”, estar bem treinada e utilizar tecnologia de apoio com consciência profissional. A formação contínua e o ambiente de trabalho que valoriza a notificação aberta e o aprendizado institucional são fundamentais. 

A transparência na gestão de erros, o envolvimento interdisciplinar e a integração de protocolos e tecnologias promovem maior segurança ao paciente. Ao mesmo tempo, a aprendizagem com cada incidente, em vez da busca por culpados, gera melhoria contínua dos processos. 

O número adequado de profissionais é indispensável para o cuidado seguro, sendo responsabilidade dos gestores e instituição proverem condições favoráveis de trabalho aos recursos humanos nas unidades. A adequação da carga horária e o quantitativo de profissionais, segundo o número e necessidades dos pacientes, representam um importante papel na redução de erros de medicação, como também menor incidência de agravos à saúde dos trabalhadores. 

A segurança do paciente depende, portanto, de um sistema que combine pessoas bem treinadas, tecnologia confiável, cultura de transparência e prática baseada em evidência científica atualizada.